A grave crise financeira e humanitária na Venezuela causa uma onda de migração inédita para o Brasil

vemvercidade 22 Out, 2016 14:06 - Atualizado em 22 Out, 2016 13:08 Isto É
Na fronteira com o Brasil, venezuelanos encaram filas para poder comprar alimentos e combustível
Reprodução/IstoÉ Na fronteira com o Brasil, venezuelanos encaram filas para poder comprar alimentos e combustível

É possível tirar pelo menos uma conclusão a respeito do lamentável momento histórico que atravessa a Venezuela: não há concessão possível a Nicolás Maduro, o ditador que comanda uma política sistemática de aniquilamento da oposição, de supressão dos direitos individuais, da liberdade de expressão, do desrespeito às instituições e que mantém o país sufocado e paralisado por uma grave crise humanitária . “O povo venezuelano está morrendo de fome e de doenças”, sintetiza a psicóloga social venezuelana Yorelis Acosta, da Universidade Central da Venezuela.

Nas últimas semanas, o Brasil conheceu mais de perto os reflexos da derrocada patrocinada por Maduro. E pelo lado mais doloroso: o da tragédia humana. O país registra uma onda sem precedentes de migração de venezuelanos, exaustos com a falta em suas cidades de produtos essenciais como alimentos, remédios e combustível. Aqui, procuram uma vida melhor. Ou, pelo menos, esperam poder comprar um quilo de arroz para alimentar a família que ficou do lado de lá. O problema é que, muitas vezes sem conseguir nem uma coisa nem outra, acabam perambulando pelas ruas de municípios de Roraima – sua porta de entrada –, pintando um triste cenário caracterizado pelo subemprego ou pela mendicância em terras brasileiras.

Os dados a respeito da entrada de venezuelanos no Brasil nos últimos tempos ainda não estão claros. Segundo a Polícia Federal, do ano passado até agora foram solicitados 1,8 mil pedidos de refúgio no País. Mas há uma imensidão de gente que entra clandestinamente, portanto não contabilizada. As cidades mais procuradas são Boa Vista, capital de Roraima, e Pacaraima, fronteira com a Venezuela. Lá, o afluxo é maior. Todos os dias, forma-se do lado venezuelano uma fila de carros esperando para entrar no Brasil. Nas ruas, o espanhol se confunde com o português. Os que vêm abastecer a despensa ou o automóvel rodam de mercado em mercado, de posto em posto de gasolina, procurando o melhor preço.

Aqueles que vêm para ficar se dividem em dois grupos. Os que têm parentes se abrigam com os seus. Os que não conhecem ninguém se juntam em quartos onde dividem o aluguel, ou ficam pelas ruas mesmo. Arrumam dinheiro nos semáforos, trocando a limpeza de pára-brisa por uns trocados, ou trabalhando na descarga de caminhões. Uma consequência infelizmente comum em circunstâncias tão difíceis é a entrada na prostituição de meninos e meninas que não encontram alternativas. Em Pacaraima, isto já preocupada as autoridades.

A situação da invasão venezuelana se agravou tanto que, na semana passada, um gabinete de emergência foi montado pelo governo de Roraima. “Os problemas estão surgindo”, contou o coronel Doriedson Ribeiro, secretário-executivo da Defesa Civil de Roraima. Muitos procuram os hospitais e as escolas brasileiras, acarretando uma sobrecarga em sistemas que não conseguem dar conta sequer da demanda interna. “Precisamos de apoio para que possamos absorver essa nova população.”

Do lado de lá, dentro da Venezuela, cresce o número de miseráveis. Em 2013, meses depois de sua posse após a morte de Hugo Chavez – seu padrinho político-ideológico – , Maduro prometeu que acabaria com a pobreza. Como toda promessa feita em cima de balelas populistas e não em sólidas consistências técnicas, não chegou nem perto de ser cumprida. Naquele ano, o índice de venezuelanos que viviam em extrema pobreza era de 5% da população. Em 2015, era de 9,3%. Segundo levantamento da Universidade Católica Andrés Bello, de Caracas, no ano passado a pobreza havia chegado a 73% dos lares venezuelanos.