Internação compulsória de usuários de drogas: Retrocesso e a volta da fabricação da loucura - Por Merioldes Silva

vemvercidade 25 Jan, 2020 13:42 - Atualizado em 25 Jan, 2020 13:58
Já ficou provado que a internação compulsória, serve apenas como medida de “saneamento” sem resolver ou ajudar ao usuário
Foto: Reprodução Já ficou provado que a internação compulsória, serve apenas como medida de “saneamento” sem resolver ou ajudar ao usuário

Estamos voltando para a época dos sem voz, sem vez e sem rostos.
Em experiências e estudos feito ao longo de décadas, ja ficou provado que a internação compulsória, serve apenas como medida de “saneamento” sem resolver ou ajudar ao usuário. Na internação compulsória, o sujeito se vê preso no seu direito de ir e vir e no momento que sai, quando sai, da clinica a primeira coisa que procura é a droga de sua preferencia e o único beneficiado é o dono da clinica. Sem um tratamento que trabalhe na base do problema, com um acompanhamento de uma equipe multi profissional, mudança de paradigmas e uma perspectiva de mudança, sócio cultural, econômico e familiar, este sujeito continua fragilizado e sem a sensação de pertencimento, estando as margens da sociedade, invisível como ser humano e estigmatizado pelo uso abusivo da droga que serve como pano de fundo para mascarar um sofrimento onde todos apontam, mas, ninguém se sente responsável.
A dependência química (substancias psicoativas), é uma doença de ordem psíquica catalogada no DSM 5 CID 10 com prognostico negativo, em raros casos (pouquíssimas exceções) se consegui reverter o quadro sem que se trabalhe este sujeito de forma holística.
E, a titulo de exemplificação de como acontece quando se abre essa caixa de pandora chamada doença mental, podemos retroceder e criarmos mais uma vez um monstro de varias cabeças que engole este sujeito, tirando sua voz, sua identidade e principalmente acabando com sua subjetividade como aconteceu em um dos manicômios brasileiro, conhecido internacionalmente como o local onde aconteceu o “holocausto brasileiro”. Realmente, o que acontecia naquele antro de horror, entre quatro paredes, só quem esteve la para testemunhar como o ser humano perde totalmente sua identidade e é tratado como bicho.
“No colônia de Barbacena, aconteceu o holocausto brasileiro com um saldo de 60 mil pessoas mortas no hospício. Foram pessoas internadas a força, enfiadas nos vagões de um trem e neste momento deixava de possuir uma identidade. Era um saneamento imposto por uma sociedade hipócrita uns, outros por pura maldade , para manter o “bom nome da família”. “ 70% não tinham diagnostico de doença mental”. Apenas eram diferentes ou ameaçavam a ordem publica. Eram epilépticos, desafetos, homossexuais, militantes políticos, mães solteiras, alcoólatras, mendigos, negros, pobres, pessoas sem documentos, prostitutas, meninas gravidas violentadas por seus patrões, esposas confinadas para que o marido pudesse morar com as amantes, filhas de fazendeiros que perderam a virgindade antes do casamento, e todos os tipos de indesejáveis, inclusive os chamados insanos. A teoria eugenista, que sustentava a ideia de limpeza social, fortalecia o hospital e justificava seus abusos. Livrar a sociedade da escória, desfazendo-se dela, de preferencia em local que a vista não pudesse alcançar.” Daniela Arbex.

    DEPOIMENTO:

    - Não sei por que me prenderam. Cada um fala uma coisa. Mas, depois que perdi meu emprego, tudo se descontrolou. Da cadeia, me mandaram para o hospital, onde eu ficava pelado, embora houvesse muita roupa na lavanderia. Vinha tudo num caminhão, mas acho que eles queriam economizar. No começo, incomodava ficar nu, mas com o tempo a gente se acostumava.

    Se existe inferno, a Colônia era esse lugar. ANTÔNIO GOMES DA SILVA. 68 ANOS. Internado aos 25 anos. 34 anos de internação.

    Segundo Abex, ele permaneceu calado durante 21 anos dos 34 em que ficou internado e todos achavam que ele era mudo. Um dia, ao ouvir a banda do 9* Batalhão da Policia Militar, soltou a voz.

    - Por que você não disse que falava? - perguntou um funcionário da unidade, surpreso com a unidade.

    - Uai, nunca ninguém perguntou.

    Por: Merioldes Silva