Menos manicômios e mais acolhimentos - Por Merioldes Silva
O Dr. Szasz, em seu livro A Fabricação da Loucura, diz que assim como muitas pessoas sofrem de doenças nos seus órgãos físicos, outras sofrem de doenças da mente e que nem por isso elas podem ou devem ser consideradas como inferiores ou violentas, que, na grande maioria das vezes, devem e podem conservar sua cidadania e respeito dentro das suas limitações, pois não são incapazes e não precisam que lhe seja imposta toda ou qualquer forma de tratamento. Ele compara ainda a perseguição que acontece com o doente mental a mesma perseguição ocorrida na idade media as feiticeiras e bruxas. Afirma ainda o autor que :
“O conceito de doença mental é análogo ao de feitiçaria. No século XV, os homens acreditavam que algumas pessoas eram feiticeiras, e que alguns atos eram devidos a feitiçaria. No XX, os homens acreditam que algumas pessoas são insanas, e que alguns atos são devidos a doença mental.”
Segundo Dr. Szasz, aquele individuo que afasta-se dos comportamentos aceitáveis pela sociedade ou família e por isso perturba ou escandaliza a mesma, é chamado de insano e é usado como bode expiatório pelos familiares, ditos normais.” É bem mais fácil esconder minha loucura apontando a do outro”. Existem, ainda de acordo com o autor, divergências do padrão estabelecido dentro de uma sociedade, se o individuo diverge deste padrão, estando acima ou abaixo, ele é rotulado e sofre um estigma , pois é visto como ameaça e assim como a caça as bruxas era aceito como normal na Inquisição, a caça ao doente mental também é aceito e até apoiado o seu encarceramento e uso de psicotrópicos como um modelador de conduta, sofrendo abusos, primeiro da religião agora da medicina. O autor, cita Michel Foucault, quando diz que a Psiquiatria Institucional, faz o grande confinamento dos insanos, como controle social e de afirmação ritualizada da ética social dominante, mostrando-se uma sucessora digna da Inquisição.
"Portanto, a divergência social é um termo que abrange uma vasta categoria. Que tipos de divergência social são considerados como doenças mentais? A resposta é que são aqueles que provocam uma conduta pessoal que não esta de acordo com regras de saúde mental psiquiatricamente definidas e impostas. Se a recusa por narcóticos é uma regra de saúde mental, a ingestão de narcóticos será um sinal de doença mental: se a conduta calma é uma regra de saúde mental, a depressão e a excitação serão sinais de doença mental, e assim por diante.”
Thomas S. Szasz
Dentro desta perspectiva, os olhares podem e devem, sofrer modificações no trato e acolhimento de toda e qualquer pessoa que tem comportamentos, cognições e praticas divergentes da nossa e que servem como nossos espelhos, muitas vezes se mostrando sem máscaras e tirando nossas máscaras também, e deixando que o outro nos vejam como tentamos o tempo inteiro esconder. Tiremos nossas máscaras, assumamos nossas insanidades e só assim teremos mais leveza, e encontraremos o que tanto procuramos: paz e felicidade, dentro do contexto onde estamos inseridos.
Vamos tirando as algemas, onde nos algemamos e algemamos o outro, aceitando a diversidade como oportunidade de crescimento. No universo tudo esta ligado de maneira harmoniosa, pela aceitação sem rótulos, preconceitos e discriminação. Se observarmos nossa pequenez dentro desta imensidão que é a vida, nos despiremos de valores que acreditamos possuir e de outros que temos e não valorizamos.
. “ Só é feliz quem tem coragem.” D. Canô
Por: Merioldes Silva Psicóloga e Especialista em Saúde Mental
Referências bibliográficas:
- Foucault, M Madness: A Historia da Insanidade. Nova York: 1965.
- Szasz, T. S. A Fabricação da Loucura: um estudo comparativo entre a inquisição e o movimento de Saúde Mental. Rio de Janeiro 1973. Zahar Editores. Segunda edição.