Seca transforma polo mundial de sisal em 'cemitério verde'

vemvercidade 02 Abr, 2017 19:11 - Atualizado em 02 Abr, 2017 19:18 G1BA
Animais também são afetados pela seca no semiárido da Bahia
Henrique Mendes / G1 Animais também são afetados pela seca no semiárido da Bahia

De eixo fino, tons rosados e aparência frágil, a "cebola-brava" crava uma raiz de esperança no solo seco do semiárido da Bahia. Resistente como o nordestino, a flor solitária que nasce de forma espaçada entre as roças do município de Valente, a cerca de 250 quilômetros de Salvador, reacende a fé dos produtores rurais. “É sinal de que a chuva, enfim, pode chegar”, revela a técnica agrícola Tamires Lopes, da Associação de Desenvolvimento Sustentável e Solidário da Região Sisaleira (Apaeb).

Além do sisal de Valente, a Apaeb compra a planta de outros municípios que também são destaque na produção, a exemplo de Conceição do Coité, Campo Formoso, Jacobina, Iraquara, Santaluz e Monte Santo. Todas as localidades estão inclusas no eixo da seca e integram um panorama de 218 municípios baianos que decretaram situação de emergência por conta da estiagem. Segundo dados da Superintendência de Proteção e Defesa Civil (Sudec), a situação já afeta mais de quatro milhões de pessoas no estado.

O anseio é iminente para uma população que tem a economia predominantemente baseada na produção do sisal, uma planta altamente tolerante ao clima seco, mas que não tem suportado o longo período de estiagem. “Eu mesmo não colho nada já tem dois anos. Está tudo morrendo e não tenho o que fazer”, admite o produtor José Maria Cunha Oliveira, que aos 52 anos de idade tem um “cemitério sisaleiro” no terreno que já abrigou 50 tarefas de plantação.

O cenário na região, segundo o Instituto do Meio Ambiente e Recursos Hídricos da Bahia (Inema), é o pior já registrado desde a década de 1960, quando os dados sobre a seca no estado passaram a ser coletados de modo substancial. O órgão acrescenta que alguns centros meteorológicos já consideram a atual conjuntura a mais crítica dos últimos 100 anos. 

Desemprego no campo

A morte de boa parte da plantação de sisal obrigou Zé Maria a parar a máquina responsável por desfibrar a planta, o que resultou na demissão de cinco pessoas que atuavam no serviço. Perto dali, na comunidade de Queimada do Curral, quem precisou tomar uma atitude semelhante foi o produtor Edílson Lima Gordino, de 54 anos.

“Nunca passou na minha roça uma estiagem como essa. Essa foi a primeira vez que parei a máquina. Isso afeta não só a mim, produtor. Você desemprega quatro ou cinco funcionários que trabalham na roça”, relata.


Incentivos


Com o agravamento da seca, a presidente da Apaeb, Iracema de Oliveira Nery, acredita que a economia do município de Valente fica comprometida. “Com essas secas constantes que vêm ocorrendo na nossa região, a gente vem perdendo muito a qualidade do sisal. E vem morrendo muito. A gente tem muito medo que esse sisal acabe. Se acabar, o produtor vai viver de qual cultura, já que o sisal é resistente à seca e que a gente vive no semiárido, que é seco?”.


A importância do sisal para a economia de Valente é destacada pela Secretaria Municipal de Agricultura e Desenvolvimento Econômico, que afirma que 85% de todos os recursos que circulam no município são oriundos da produção e comercialização da planta. A estimativa do órgão é de que ao menos 237 produtores vivam diretamente da lavoura sisaleira.